RELIGIOSIDADE E TRADIÇÃO CULTURAL EM TORTO ARADO, DE ITAMAR VIEIRA JÚNIOR

Resumo

Recentemente, tem-se observado um expressivo crescimento do número de publicações ficcionais de autoria afro-descendente, com enfoque para as suas tradições e subjetividades. Trata-se de um contexto estimulado pelo campo de debates da decolonialidade, que valoriza a discussão das identidades e alteridades, vistas em confronto e complementaridade. A partir desse campo, o presente trabalho tem como objetivo abordar a questão religiosa no romance Torto arado, de Itamar Vieira Junior, que se notabilizou nos últimos anos. Para tanto, esta pesquisa parte de uma abordagem transdisciplinar, a partir da qual se articulam a leitura crítica da obra em pauta a discussões de aspectos da religiosidade afro-descendente e da teoria social da fragmentação das identidades culturais tal como discutidas por Stuart Hall (2015). Assim, observa-se que a religiosidade do Jarê é um elemento constitutivo da constituição das subjetividades na obra em análise. Mais que isso, trata-se de uma reflexão sobre as identidades femininas negras, vistas historicamente como o outro do homem branco ocidental, o que é tematizado na obra inclusive pela presença dos “encantados” que se incorporam nos personagens do livro (ou seja, trata-se do outro que, enquanto outro, se dá a ver no espaço religioso e no espaço ficcional do romance). Portanto, a produção ficcional de Itamar Vieira Junior reafirma a memória das tradições afro-descendentes, resistindo ao apagamento operado pelos processos colonizatórios.